Profissionais da moda não aguentam o ritmo de trabalho nas maisons. Será o burnout?
Esses dias eu me deparei no Linkedin com uma psicóloga comentando sobre o burnout na moda.
Curiosamente, ela falava de uma estilista talentosa com quem trabalhei em Milão.
O burnout apanhou a minha colega em cheio!
Isso não me surpreendeu, nem é novidade para mim.
Vi isso acontecer com muitos outros profissionais no meu trabalho em Milão, Londres e agora em Roma.
No entanto, isso ganha destaque quando o mal-estar e o esgotamento atingem os grandes nomes da moda, como Gisele Bündchen, Alexander McQueen e, mais recentemente, Daniel Lee.
Nós já comentamos sobre o stress no trabalho na moda, mas o burnout vai além, e é isso que contamos no nosso post.
Daniel Lee e o sucesso de Bottega Veneta!
Aqui na Itália, a saída de Daniel Lee da direção criativa da Bottega Veneta abalou o mundo da moda; foi descrita como un fulmine a ciel sereno.
Uma tempestade num céu tranquilo!
De fato, ele estava no apogeu e a sua saída foi inesperada!
Durante os três anos que ele esteve à frente da direção criativa da maison, Daniel Lee levou a marca à um ápice glorioso, um momento sem precedentes, que fez com que os seus admiradores a apelidassem “New Bottega”.
A marca hoje, graças a ele, representa o luxo autêntico que inspira as novas gerações, dos Millenials à GenZ, e deixa fascinados muitos influenciadores genuínos e apaixonados por moda.
Hoje a Bottega Veneta é uma das marcas mais amadas também no cenário brasileiro.
Basta abrir o Instagram, o Tik Tok e outras mídias socais para nos depararmos com as mais adoráveis e “controversas” peças da marca.
No meio da moda pergunta-se: por trás de uma decisão repentina de Daniel Lee, num momento de tanto sucesso, não estaria o tão temido burnout?
Não sabemos a real causa do adeus de Daniel Lee, se foi burnout, mas muito se especulou na mídia sobre a saída dele no auge do sucesso!
Como comenta Rui Matos na Vogue, só o tempo dirá se o designer se afastou em razão da pressão que a indústria da moda coloca nos criativos ou se uma nova oportunidade está na linha do horizonte.
De toda a forma, o burnout é uma realidade no trabalho na moda, um problema que deveria ser amplamente discutido.
Ele nos atinge, profissionais da indústria da moda, nos mais diferentes níveis.
Mas o que é burnout?
Muito tem se escrito sobre o assunto.
Em 2019, a Organização Mundial de Saúde incluiu o burnout na classificação internacional de doenças, considerando-o como uma síndrome resultante do estresse crônico no local de trabalho.
Ou seja, não é uma doença, mas um fenômeno ocupacional.
Segundo a OMS, o burnout é caracterizado por três dimensões:
- sensação de esgotamento ou exaustão de energia;
- aumento da distância mental do trabalho ou sentimentos de negativismo ou cinismo relacionados ao trabalho; e
- eficácia profissional reduzida.
Burnout na moda é o tema do momento!
Nesses nove anos trabalhando na moda para grandes marcas convivi com inúmeros colegas que passaram por situações similares.
Profissionais excelentes, dedicados, que não suportaram o estresse no trabalho e resolveram largar tudo!
Quando trabalhei em Londres o braço direito de Riccardo Tisci na Burberry, um estilista excepcional, foi embora de um dia para o outro. Detalhe, logo após ter sido promovido.
Outra colega, esgotada, deixou uma posição excelente na empresa e foi para um ashram na Índia, fazer formação em Yoga.
Poderia contar muitos outros casos similares…
O burnout na moda é um fato; esses profissionais não são tão famosos quanto Daniel Lee, mas eram igualmente criativos, comprometidos e apaixonados pelo trabalho na moda!
As altas expectativas e a pressão excessiva nas maisons de moda, podem nos levar a uma situação de stress extremo, com a constante pressão em relação à performance.
Isso sem falar nos prazos, nas inúmeras coleções lançadas todos os anos e a necessidade contínua de expandir os negócios.
Curiosamente é nos momentos de maior sucesso que atender às expectativas dos clientes, dos investidores e da mídia se torna ainda mais difícil e a pressão se torna ainda maior.
Imagina a angústia e a ansiedade de ter que criar coleções de sucesso, uma depois da outra, com peças que voam das prateleiras, explodem na mídia.
O trabalho do diretor criativo, que se assemelha à arte, requer liberdade no tempo, e este nem sempre coincide com os apertados cronogramas dos negócios.
Na verdade, já faz tempo que trabalhar na indústria da moda virou sinônimo de “over-working” com um aumento progressivo das horas de trabalho na exasperante busca pela hiperprodutividade.
Isso sem contar o calendário de eventos, desfiles e lançamento de novas coleções que não tem fim.
Sem dúvida o burnout é um problema que atinge os profissionais da moda e deveria ser amplamente discutido!
Como bem observa Mariana Varella, editora chefe do portal Drauzio Varella e colunista da UOL, seria muito bom se as discussões sobre o burnout servissem para repensar as relações de trabalho, e não apenas para lotar os consultórios médicos e vender antidepressivos.
Ainda mais numa indústria em que, desde o diretor criativo até o assistente, todos nos “matamos” de tanto trabalhar (sob pressão!).
Isso não é um verdadeiro convite ao burnout?
Vale a pena conferir o site Burnoutados Anônimos, um projeto da Carol Milters que promove encontros abertos, gratuitos e confidencias para ajudar quem está vivendo o burnout.