Nostalgia um ato radical na moda

Do Red Valentino ao Surrealismo: a nostalgia — um ato radical

Sempre comento no nosso Observatório de Tendências, a base e a força motriz de todo o nosso processo criativo nas consultorias de moda, que analisar tendências de forma sistemática é fundamental para enriquecer nossas criações com repertório, contexto e propósito. Afinal, a moda não acontece no vácuo — ela reflete e dialoga com o mundo ao nosso redor.

Claro que não defendemos uma adesão automática ao novo, nem seguir tendências de forma acrítica, mas sim acompanhá-las com vistas ao desenvolvimento de um estilo autoral e consistente, capaz de se posicionar com inteligência dentro desse panorama em constante movimento.

Por isso, acompanhamos de perto o que está acontecendo no universo da moda e traduzimos essas observações em reflexões, inspirações e caminhos criativos alinhados à identidade única de cada projeto.

Nesse contexto, um interessante artigo da Harper’s Bazaar chamou a atenção do nosso observatório: ‘Nostalgia e archeologia: i termini della moda contemporanea’, que nos convida à reflexão.

Com o passar dos anos e o surgimento de novas gerações de estilistas, nota-se um movimento de retorno a formas familiares, como se o passado oferecesse um terreno mais seguro diante das incertezas contemporâneas.

A partir dos anos 1960, com a ascensão da Arte Povera e, pouco depois, com criadores como Yohji Yamamoto e Rei Kawakubo, iniciou-se uma ruptura com os padrões estéticos tradicionais.

Valorizavam-se, então, a imperfeição e a desconstrução como formas de expressão, marcando um posicionamento crítico em relação às normas vigentes e revelando uma forte conexão com o tempo presente.

Assim, nasce e se consolida o pós-modernismo na moda: os designers passam a “escavar” a história, investigando e ressignificando referências do passado para dar origem a algo inédito e cheio de significado no presente.

A reinvenção da Valentino por Alessandro Michele

Alessandro Michele assumiu a direção criativa da Valentino em 2024 — não sem críticas, é claro. Li muitos especialistas comentando sua primeira coleção com a provocação: “Teria sido Valentino quem assumiu Alessandro Michele, ou o contrário? 

Conhecido por revitalizar a Gucci com sua estética maximalista e repleta de referências históricas, ele agora adota essa abordagem na maison romana. Isso é um exemplo claro de como a nostalgia pode ser usada como ferramenta criativa — não apenas como uma fuga para o passado, mas como um meio de diálogo com o presente.

Gosto muito de citar essa definição do estilo singular de Michele em minhas consultorias, tal como foi formulada por Danda Santini, então diretora da Elle.

Alessandro Michele interpretou e sintetizou na moda temas leves e sérios que expressam o espírito da época: a variedade e fluidez das identidades sexuais, a nostalgia do passado, o desejo de cor, que é uma característica distintiva do Made in Italy e da Gucci, o prazer de misturar e pegar emprestado inspirações do street style. O resultado é uma estética excêntrica e decadente que acertou perfeitamente.

E, quando Michele estreou na Paris Fashion Week com a coleção Primavera-Verão 2025, ficou claro que ele ainda seguia esse caminho de mesclar passado e presente de forma única. O desfile, composto por 48 looks, foi uma verdadeira “constelação de visões”, como foi descrito. A coleção, chamada Pavillon des Folies, foi um passeio onírico por diferentes épocas e culturas, unindo fragmentos do passado com uma narrativa completamente atual.

Michele reinterpretou os códigos clássicos da Valentino — o icônico Red Valentino, os babados, os plissados — e os inseriu em peças que oscilavam entre a opulência de outrora e a fluidez do presente. Capas com penas, vestidos exuberantes e até balaclavas compunham um repertório visual que fundia o glamour tradicional com influências das culturas urbanas contemporâneas, desafiando fronteiras estéticas com poesia e provocação.

A nostalgia como diálogo com o presente

A abordagem de Michele vai além de simplesmente reviver estilos passados. Ele utiliza a nostalgia como um meio de diálogo com o presente, reinterpretando elementos históricos para refletir as complexidades e nuances da contemporaneidade. Em entrevista à Vogue Italia, Michele destacou a importância de respeitar os códigos da maison, enquanto os reinterpreta com seu olhar contemporâneo, buscando aquilo que foi esquecido ou deixado de lado.

Essa filosofia é evidente na forma como ele combina diferentes épocas e estilos, criando uma “cacofonia estética” que, embora pareça desordenada à primeira vista, revela uma harmonia cuidadosamente construída. Essa abordagem permite que o familiar se torne surpreendente, desafiando as expectativas e expandindo os limites do que é possível na moda.

Outros exemplos de nostalgia criativa na moda contemporânea

Além de Michele, outros designers têm explorado a nostalgia como uma ferramenta criativa. 

Na alta-costura, sob a direção criativa de Daniel Roseberry, a maison Schiaparelli tem revisitado os conceitos de sua fundadora, Elsa Schiaparelli, trazendo à tona os elementos surrealistas que marcaram sua história e referências às suas icônicas colaborações com artistas renomados, como Salvador Dalí.

Lembro bem da coleção de alta-costura Primavera-Verão 2021 de Daniel Roseberry para a Schiaparelli — foi impossível passar por ela sem se deixar impactar. 

Os vestidos eram uma homenagem evidente ao icônico Lobster Dress de Dalí, mas o que mais me chamou a atenção foi a maneira como Roseberry conseguiu unir referências tão fortes com uma linguagem extremamente contemporânea. 

Os volumes, as cores intensas, os detalhes tridimensionais… tudo ali falava alto do espírito surrealista da maison. E os acessórios — como as luvas com garras e as máscaras douradas — pareciam saídos diretamente de um sonho, inspirados nas obras de Man Ray e Alberto Giacometti.

Já Nicolas Ghesquière escolheu comemorar seus dez anos à frente da Louis Vuitton de forma emblemática. Na coleção apresentada em 2024, revisitou alguns dos códigos que construiu ao longo dessa década, reintroduzindo estilos que marcaram sua trajetória na maison. 

Mas não se tratava apenas de olhar para trás — o desfile também abria caminhos para novas possibilidades estéticas. Bordados minuciosos, alfaiataria de linhas arquitetônicas e silhuetas que equilibravam opulência e leveza deram o tom da coleção, que foi tanto uma homenagem quanto uma reinvenção.

Ao mesmo tempo, elementos nostálgicos permeiam tanto a alta-costura quanto o prêt-à-porter, como nas coleções de Balenciaga e Schiaparelli, apresentadas nas últimas semanas de moda. Ombreiras e silhuetas estruturadas, que foram icônicas nas décadas de 1980 e 1990 e marcaram as coleções de seus fundadores, estão sendo trazidas de volta às passarelas.

A nostalgia, quando usada com intenção e sensibilidade, pode ser uma aliada poderosa no processo criativo. 

Ela permite que os designers olhem para o passado, não como um lugar de fuga, mas como um campo fértil de significados, pronto para ser reimaginado à luz do presente.

É isso que vemos, por exemplo, no trabalho de Daniel Roseberry à frente da Schiaparelli, de Alessandro Michele na Valentino e de Nicolas Ghesquière na Louis Vuitton. Cada um, à sua maneira, mostra como a moda pode ser esse ponto de encontro entre memória e invenção — um espaço onde referências antigas ganham novos sentidos e onde o passado se costura ao agora para dar vida a algo único.

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