Em 2019, na Burberry, tive meu primeiro contato com o uso da tecnologia na criação de roupas virtuais em 3D. A experiência de trabalhar com o Clo 3D na equipe de desenvolvimento de produtos em Londres foi transformadora.
Desde então, muita coisa mudou!
Hoje, trabalho em Roma e dou aulas de desenvolvimento de produto de moda no Istituto Marangoni em Paris e, na prática, vejo que o uso de tecnologias como rendering 3D e inteligência artificial na moda simplesmente explodiu!
A sala de aula é meu espaço para compartilhar conhecimento, e as consultorias e mentorias me permitem acompanhar a evolução das empresas e dos profissionais na moda.
Tanto nas consultorias quanto nas aulas e mentorias, exploramos juntos o panorama atual da moda, bem como o “zeitgeist”, ou espírito do tempo.
Essa abordagem é fundamental para quem deseja empreender ou trilhar uma carreira de sucesso na indústria da moda.
Nesse contexto, abordamos temas como inclusão, sustentabilidade, tecnologia e tudo mais o que envolve a moda contemporânea. E uma questão está ganhando cada vez mais destaque é a inserção e uso da IA na moda.
Recentemente, em uma das minhas consultorias, discutimos a revolução da IA na moda, a criação de roupas virtuais em 3D e como a crescente acessibilidade dessas ferramentas está transformando o setor.
Mas uma pergunta surgiu: as equipes criativas são mais resistentes a essa transformação tecnológica?
Minha experiência em empresas de luxo me deu insights valiosos sobre esse tema, que compartilho neste post.
Como a tecnologia está redefinindo o conceito de luxo?
Segundo Mathilde Haemmerlé, da Bain & Company, a tecnologias como IA no setor de luxo deve ser vista como um complemento à criatividade humana, “intervindo com um toque discricionário e enriquecendo a experiência do cliente”.
No entanto, observo que a adoção da tecnologia na moda ainda tem sido gradual, com foco inicial na otimização de processos operacionais.
Marcas de luxo como Stella McCartney e Burberry estão utilizando a tecnologia para otimizar suas cadeias de suprimentos.
Ao mesmo tempo, Gucci e Valentino estão aproveitando para oferecer experiências de compra personalizadas, como chatbots e assistentes virtuais inteligentes.
Além de otimizar a cadeia de suprimentos e personalizar a experiência do cliente, as ferramentas cada vez mais estão auxiliando os designers na criação de novas coleções, fornecendo insights sobre as últimas tendências e automatizando tarefas repetitivas.
Essa otimização permite que os designers se concentrem em atividades que exigem mais criatividade, como a definição da identidade da marca.
Um estudo da Bain & Company oferece uma visão otimista da transformação digital na indústria da moda: “A vida cotidiana vai mudar, mas de forma suave. As equipes manterão o controle da direção artística, da mensagem, do produto e da campanha.”
Essa perspectiva sugere uma harmonia entre a tecnologia e a criatividade, onde a tecnologia potencializa o trabalho dos designers, sem substituí-los.
Já assistimos isso em vários setores e atividades na sociedade contemporânea, como a arquitetura e o design com o BIM (Building Information Modeling) e a impressão 3D, a educação com realidade virtual e a medicina com cirurgia robótica e próteses 3D.
No entanto, na moda, em algumas das minhas consultorias, surge uma questão prática: as equipes criativas estão prontas para abraçar essa nova realidade e explorar todo o potencial que a tecnologia oferece?
Como comentei, na Burberry, tive a oportunidade de vivenciar em primeira mão a transformação digital no processo de desenvolvimento de produtos.
A empresa apostava fortemente na eliminação da prototipagem física, utilizando softwares como o Clo 3D para criar modelos 3D e realizar provas virtuais. Essa inovação proporcionava agilidade e economia significativas para a equipe de desenvolvimento.
Vale lembrar que o Clo 3D é um software de design de moda 3D que revolucionou a forma como as roupas são criadas e visualizadas na indústria da moda.
Com ele, é possível criar peças de roupa virtuais em 3D de forma rápida e precisa, permitindo que estilistas visualizem seus designs em um avatar 3D antes mesmo de serem produzidos fisicamente.
O software permite criar peças de roupa com alta precisão, incluindo detalhes como costuras, texturas e padronagens.
É possível simular como a roupa se movimenta em um corpo em diferentes poses, o que ajuda a identificar problemas de ajuste e caimento antes da produção.
As alterações feitas no design são visualizadas em tempo real, permitindo que o designer faça ajustes rapidamente.
No entanto, lá havia um abismo entre a nossa visão e a da equipe criativa. Eles sentiam que a tecnologia estava desvalorizando a expertise e criatividade deles.
Desde então, observo que essa questão permanece na mente de alguns profissionais do setor, embora muitas vezes de forma velada.
Será que essa percepção era justificada?
É, sem dúvida, uma pergunta que exige uma reflexão.
O que é certo é que a tecnologia é uma ferramenta que amplifica a criatividade humana.
Ao invés de substituir a expertise dos designers, ferramentas como IA e softwares como Clo 3D auxiliam na geração de novas ideias e na otimização de processos, liberando tempo para que os profissionais se concentrem no que fazem de melhor: criar.
A integração de tecnologia e criatividade é um desafio que muitas empresas enfrentam, mas, do meu ponto de vista, é inexorável.
Hoje muitas outras ferramentas de AI estão disponíveis na indústria da moda, como Bronzwear, Style3D, The Fabricant, Heuritech, Replikate e The New Black, só para citar algumas…
Mais de 1000 marcas como Puma, Nike e PVH Corp (dona de marcas como Calvin Klein e Tommy Hilfiger) e fabricantes de vestuário utilizam a Browzwear, plataforma líder em design de moda 3D, para simular tecidos e ajustes com precisão, otimizando o desenvolvimento de produtos e reduzindo tempo e custos.
Já a Heuritech, utilizada por marcas como Louis Vuitton, Dior e Chanel, é reconhecida por sua capacidade de prever tendências de moda com grande precisão meses antes de se tornarem populares. Isso permite que as marcas ajustem suas coleções de acordo com as preferências do mercado, aumentando as chances de sucesso comercial.
E muitas empresas como a startup californiana Unspun fundada em 2017, já estão utilizando da tecnologia de impressão 3D, análise de dados e AI para criar tecidos e roupas sob demanda e, com o isso, reduzindo o desperdício de material e promovendo práticas mais ecológicas na indústria da moda.
Essa combinação de personalização, tecnologia e sustentabilidade é, inclusive, um exemplo de como a moda pode evoluir para ser mais responsável em relação ao meio ambiente com ajuda da IA.
Na verdade, tudo isso se insere no contexto da Indústria 4.0, como ficou conhecida a Quarta Revolução Industrial em curso, caracterizada pela integração de tecnologias digitais, físicas e biológicas avançadas ao setor produtivo.
Essa transformação está redefinindo a indústria da moda, apresentando novas oportunidades e desafios para nós, profissionais da área, como comentamos no nosso post: 5 novidades imperdíveis da indústria 4.0 na moda.
Assim, diante deste cenário, na minha opinião, a chave para o sucesso está em construir uma cultura organizacional que valorize tanto a tecnologia quanto a criatividade.